O episódio do McKinsey Podcast apresenta uma análise profunda sobre os desafios e oportunidades enfrentados pela indústria da moda em 2025. A conversa acontece entre Gemma D’Auria, sócia sênior da McKinsey em Milão, e Lucia Rahilly, diretora editorial global da McKinsey. Diante de um cenário marcado por instabilidade econômica, mudanças geopolíticas, transformações no comportamento do consumidor e o avanço da inteligência artificial, as duas especialistas exploram tendências emergentes, mudanças estruturais e estratégias para o futuro da moda global.
Pontos-chave (Key Insights):
- Consumidores mais conscientes e dinâmicos: A busca por valor, autenticidade, personalização e sustentabilidade está mudando a forma como se consome moda.
- Avanço da tecnologia e da IA: Inteligência artificial e dados estão transformando desde a experiência nas lojas até o desenvolvimento de produtos e o relacionamento com o cliente.
- Necessidade de adaptação estratégica: Em um mundo instável, as marcas devem operar com flexibilidade, investir em análise de dados, fortalecer cadeias de suprimento e colaborar com parceiros e reguladores.
Mudanças no comportamento do consumidor e novos mercados
A indústria da moda em 2025 está diante de uma revolução silenciosa no comportamento do consumidor. Em tempos de inflação, incerteza e excesso de oferta digital, o cliente tornou-se mais seletivo e sensível ao valor percebido. Não se trata apenas de preço baixo, mas de fazer escolhas inteligentes. Um exemplo disso é o crescimento dos “dupes” — réplicas bem-feitas de produtos de luxo que agora são usadas com orgulho, sinalizando esperteza, não vergonha.
Outro fenômeno crescente é o mercado de revenda. A busca por produtos exclusivos, fora de catálogo e com narrativa própria impulsiona a compra de artigos de segunda mão, especialmente no setor de luxo. Paralelamente, plataformas digitais e ferramentas baseadas em IA ajudam a reduzir a sobrecarga de opções, personalizando recomendações e tornando a jornada de compra mais eficiente e relevante.
Ao mesmo tempo, novas geografias se tornam protagonistas. A China já não cresce como antes, mas Índia e Oriente Médio despontam com potencial transformador. A Índia, com 430 milhões de pessoas na classe média e uma população jovem, atrai marcas interessadas em adaptar-se às particularidades locais. Já capitais como Jacarta e Bangkok começam a despontar como centros de moda alternativos.
Há ainda um importante grupo muitas vezes negligenciado: os consumidores com mais de 50 anos. Eles já representam 38% dos gastos de consumo globais e respondem por metade do crescimento no setor. A indústria, acostumada a focar nos jovens, agora precisa pensar em como ser relevante para o público mais maduro — em estilo, linguagem e experiência.
A tecnologia como alavanca de diferenciação e eficiência
A tecnologia — com destaque para a inteligência artificial — está reconfigurando os pilares da indústria da moda. O uso de IA para personalização tornou-se uma fronteira estratégica. As marcas que dominam dados e algoritmos conseguem oferecer experiências personalizadas, tanto no digital quanto nas lojas físicas. Essa customização não é mais luxo: é necessidade para capturar e manter clientes em um mercado desacelerado.
Além disso, a IA está começando a impactar a criatividade. Em vez de produzir amostras físicas de centenas de versões de uma bolsa, por exemplo, é possível criar e testar digitalmente inúmeras variações, reduzindo desperdício e custos. A McKinsey estima ”que até 25% do potencial da IA na moda virá do lado criativo. Mas essa jornada ainda está no começo”.
As lojas físicas, antes ameaçadas pelo comércio eletrônico, passam por uma reinvenção. Elas se tornam centros de experiência e conexão com a marca — menos estoque, mais imersão. Estudos mostram que consumidores estão mais propensos a gastar quando recebem um bom atendimento, e muitas marcas apostam em treinamentos, ferramentas de IA e integração entre canais para revitalizar suas lojas.
Por fim, a construção de comunidades de marca, tendo como exemplo marcas desafiadoras no segmento esportivo como Hoka, On e Vuori, se mostrou poderosa, num mercado que sempre foi dominado por marcas já consolidadas como Nike, Adidas e Under Armour. A fidelização deixou de ser uma consequência para se tornar um objetivo estratégico, nutrido por conteúdo, propósito e diálogo direto com o consumidor.
Adaptação estratégica em tempos de incerteza
A instabilidade geopolítica, os riscos climáticos e as transformações regulatórias impõem às marcas uma nova exigência: adaptabilidade. Não basta apenas ter planos de contingência. As marcas precisam desenvolver capacidade real de reavaliar e redirecionar estratégias rapidamente, com base em múltiplos cenários possíveis.
A cadeia de suprimentos, por exemplo, é uma área crítica. Eventos climáticos extremos podem comprometer bilhões em exportações e milhares de empregos. Portanto, reconfigurar a cadeia — considerando custo, resiliência e impacto ambiental — é essencial. A cooperação com fornecedores passa a ser mais estratégica do que transacional. Parcerias de longo prazo, uso de dados e incentivos compartilhados são pilares para construir resiliência.
A sustentabilidade permanece no centro da pauta, mas com novos dilemas. As marcas enfrentam pressões de reguladores e consumidores para adotar práticas sustentáveis, mas muitas vezes sem retorno financeiro direto. Pequenos fornecedores — que representam 60% da produção mundial — têm dificuldades em atender às exigências sem apoio financeiro e previsibilidade de demanda.
A saída está em lideranças mais colaborativas e propositivas. As marcas que conseguirem articular sua responsabilidade ambiental com viabilidade comercial — por meio de dados, inovação e alianças — estarão melhor posicionadas para um futuro em constante mudança.
Diante deste cenário, a indústria da moda está sendo desafiada a repensar suas estratégias em múltiplas frentes — do comportamento do consumidor à sustentabilidade, passando pela tecnologia e geopolítica. O que antes era diferencial, agora é essencial: entender profundamente o cliente, adotar tecnologias que gerem valor real e agir com agilidade diante do imprevisível. O futuro da moda não pertence apenas às marcas maiores ou mais tradicionais, mas àquelas que conseguirem unir criatividade, dados e propósito com um olhar atento às mudanças do mundo e às demandas de um consumidor cada vez mais consciente e exigente.
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