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Como grandes culturas são construídas e reconstruídas

O recente episódio “How great cultures are built and rebuilt, do podcast “Masters of Scale“, focou em como culturas empresariais são criadas e reconstruídas. Este episódio abordou, de maneira única, os desafios e estratégias envolvidos no cultivo de uma cultura organizacional forte – aspecto crucial para o sucesso de qualquer negócio –, e contou com a presença de executivos que ocupam ou ocuparam altas posições em empresas como Apple, Google e Uber.

Masters of Scale” é um podcast conhecido por suas discussões sobre negócios, liderança e empreendedorismo. Frequentemente, apresenta entrevistas com líderes empresariais e pensadores renomados, que compartilham suas experiências e percepções sobre vários aspectos do crescimento e gestão de negócios. A série é reconhecida por sua habilidade em aprofundar-se na mecânica de escalar negócios, explorando tanto sucessos quanto fracassos.

O episódio “How great cultures are built and rebuilt”, em especial, foi apresentado por Bob Safian – ex-editor da Fast Company e fundador do Grupo Flux. Apresentou um painel distinto de convidados: Angela Ahrendts, ex-CEO da Burberry e head de varejo da Apple; Eric Schmidt, ex-CEO da Google; e Dara Khosrowshahi, CEO da Uber. Esses líderes compartilharam suas ricas experiências e lições aprendidas ao liderar grandes transformações organizacionais, oferecendo insights valiosos sobre a dinâmica de construir e remodelar a cultura de empresas globais proeminentes.

Gerenciamento versus liderança

Durante o episódio, Dara Khosrowshahi, CEO da Uber, aborda um tema crucial na gestão empresarial: a distinção entre gerenciamento e liderança. 

Dara ressalta que o gerenciamento está mais relacionado ao aspecto racional e organizacional, ou por sua definição, à “cabeça”; envolve processos, estruturas e a execução das tarefas do dia a dia, com foco em manter a organização e a eficiência operacional. Essa vertente é fundamental para garantir que as operações corram de maneira suave e previsível, mas é apenas uma parte do que é necessário para dirigir uma organização com sucesso​​.

Em contrapartida, Dara destaca que a liderança vai além dos aspectos técnicos e racionais: está mais conectada ao “coração”; envolve inspiração, motivação e o cultivo de um senso de propósito compartilhado. A liderança é sobre entender e se conectar com as pessoas, estimulando-as a alcançar seu potencial máximo e a aderir à visão e aos valores da empresa. 

Essa distinção revela que, embora o gerenciamento seja essencial para a manutenção da ordem e da eficiência, a liderança é crucial para inspirar inovação, lealdade e um comprometimento profundo com os objetivos organizacionais.

Facilitar e conectar

Angela Ahrendts, head de varejo da Apple, ao discutir a essência da liderança autêntica, compartilha insights baseados em suas experiências na Burberry e na Apple. Ela enfatiza que, à medida que se ascende na hierarquia de uma organização, torna-se crucial ser mais autêntico e humano. Angela ilustra isso com um exemplo de sua própria experiência, descrevendo-se como uma “facilitadora” e “conectora” – focada em reunir pessoas talentosas, estabelecer relacionamentos de confiança e emponderá-las para agir. Em postura humilde, ela salienta que não se considera a pessoa mais inteligente – mas sim alguém que habilita os outros a atingirem seu potencial máximo​​.

Angela também destaca a importância da transparência e autenticidade na liderança. Ao ingressar na Apple e se deparar com o monumental legado de Steve Jobs, ela utilizou sua experiência e maturidade para adotar uma abordagem genuína e humana, facilitando sua transição e contribuindo significativamente para a cultura da empresa. 

Nos seus primeiros dias na empresa, ela conta que, ao ser abordada pelo RH para enviar um texto de e-mail para se apresentar aos seus colaboradores, fez questão de gravar um vídeo de 3 minutos. Quando o RH acrescentou que existia um estúdio disponível para gravação, ela respondeu: “será somente um take, do meu iphone, no meu escritório”. E foi o que aconteceu – mesmo com seu único take sendo interrompido por uma ligação de sua filha.  Angela narra que recebeu um feedback incrível dos colaboradores por sua espontaneidade e humanidade. Esse relato reflete a necessidade de os líderes serem verdadeiros e se conectarem com suas equipes em um nível pessoal​​ – afinal, liderança eficaz combina direção estratégica com compreensão e empatia. Ser autêntico não é apenas desejável, mas essencial para qualquer líder que busca estabelecer uma cultura organizacional forte e coesa.

Invadindo o escritório do CEO

Eric Schmidt, ex-CEO da Google, ao compartilhar uma anedota de seus primeiros dias na Google, ilustra vividamente a cultura única e inovadora da empresa. Em um episódio curioso, ao chegar em sua sala, ele descobriu que Amit, um dos engenheiros, havia se instalado no mesmo local – justificando que Schmidt raramente estava presente e que a mudança havia sido aprovada por um VP. Em vez de reagir negativamente, Schmidt reconheceu a situação como um teste de liderança e adaptabilidade; e, após um vacilante “Ok…”, resolveu sentar-se em sua mesa e continuar seu trabalho de CEO junto a seu novo vizinho.  

A história ganha um tom ainda mais interessante quando Amit, após ouvir um call de Schmidt sobre metas de receita, o aborda para corrigir algumas metas de receita (subestimadas) que estavam sendo enviadas para o CEO. Por ser um engenheiro de revenues analytics, Amit pôde oferecer insights precisos para Schmidt. Esta interação não só demonstrou a profundidade do talento disponível dentro da Google, mas também enfatizou a importância de ouvir e aprender com todos os membros da equipe – independentemente de sua posição na empresa.

Schmidt conta que extraiu uma lição valiosa dessa experiência: a percepção dos benefícios de ter, por perto, pessoas com habilidades diversas e aprofundadas. Ele continuou a explorar esse conceito, colocando novos especialistas próximos ao seu escritório para trazer perspectivas únicas e alertá-lo sobre anomalias – o que, eventualmente, os levou a identificar uma crise significativa. Essa narrativa exemplifica como a abordagem não convencional da Google à gestão e ao espaço de trabalho contribui para uma cultura corporativa que valoriza a inovação, a colaboração e a aprendizagem contínua.

Demita alguém

Durante a conversa, Dara Khosrowshahi aborda os desafios culturais enfrentados ao ingressar na Uber, enfatizando a jornada contínua de transformação cultural da empresa. Ele destaca um momento crucial, durante um encontro geral na Uber, no qual uma pergunta sobre a “crise de RP” da empresa foi levantada. 

Dara respondeu enfaticamente que o problema não era de relações públicas, mas sim interno (“an us problem”) – enfocando a necessidade de a empresa primeiro se reformar, em termos de ações, promoções e comportamento, antes de poder resolver sua imagem pública. Esta declaração foi um ponto de inflexão, sinalizando o início de mudanças significativas na empresa e reforçando a ideia de que a substância e a autenticidade são fundamentais no mundo empresarial moderno (“… ultimately, especially in this world, the substance always comes out. You can’t pretend anymore”).

Em um polêmico trecho do podcast, Dara ainda relata um conselho marcante que recebeu de um mentor ao assumir um novo cargo: “Demita alguém“. Este conselho, embora à primeira vista drástico, foi explicado como um meio de demonstrar seriedade e compromisso com a mudança. Dara destaca que essa tomada de ação é um sinal para a equipe de que a liderança está comprometida com a transformação e disposta a tomar decisões difíceis para alcançar os objetivos da empresa. Ele ressalta que mudanças dolorosas são necessárias em situações de transformação organizacional – pois, apenas quando são feitas alterações significativas, a equipe percebe a seriedade da situação e a necessidade de mudança. Este conselho simboliza a importância de uma liderança decisiva e assertiva em momentos de reviravolta ou reestruturação de uma empresa.

Este segmento do episódio ilustra as complexidades e os desafios de conduzir mudanças culturais significativas dentro de uma organização; revela que a transformação efetiva requer não apenas uma reavaliação das práticas e políticas existentes, mas também uma liderança forte, disposta a tomar decisões difíceis e comunicar-se abertamente com a equipe para alinhar e mobilizar em torno de uma visão compartilhada.

Autenticidade e alinhamento de valores

Dara também compartilha uma experiência reveladora sobre a autenticidade na liderança, que ressoa profundamente com a natureza dinâmica da cultura organizacional. Ao ler um artigo na Forbes sobre um gestor que costumava caminhar pelos corredores da empresa para visualizar o que estava se passando, Dara tentou adotar formalmente a técnica de “andar pelos corredores” para entender melhor o que se passava na Uber (ele tinha até mesmo slots bloqueados em sua agenda para… andar pelos corredores). Dara rapidamente percebeu que essa abordagem não se alinhava com seu estilo pessoal, resultando em interações forçadas e desconfortáveis. Essa tentativa, embora bem-intencionada, destacou a importância de ser fiel ao próprio estilo de liderança, em vez de tentar imitar outros. Essa experiência ilustra um princípio essencial: a autenticidade é fundamental para uma liderança eficaz e para promover uma mudança genuína dentro de uma organização.

Angela reforça essa ideia ao comparar a cultura de uma empresa com a personalidade de um indivíduo. Ela argumenta que, assim como as pessoas têm personalidades únicas, as empresas também têm culturas distintas, que são moldadas pela confiança e alinhamento de valores entre os membros da equipe. A head da Apple acredita que uma base sólida de confiança desbloqueia o pensamento criativo e a inovação, contribuindo para o sucesso contínuo da empresa. Essa visão é um lembrete de que a cultura de uma organização é um organismo vivo, que evolui e se adapta constantemente.

Eric oferece um conselho pragmático sobre a contratação e gestão de pessoas em startups e organizações estabelecidas: para startups, ele sugere a simplicidade de contratar as pessoas mais talentosas possíveis, reconhecendo que elas são essenciais para obter vantagem competitiva; não obstante, em organizações já estabelecidas, a abordagem de gestão deve ser diferente. A estratégia recomendada, em tal caso, é levantar a questão se a empresa está utilizando as melhores práticas e o estado da arte (“state of art”) em suas operações – e deixar os colaboradores responderem. Schmidt enfatiza, aqui, a importância de ouvir os funcionários, pois eles fazem parte de uma rede mais ampla e possuem conhecimentos que a liderança pode desconhecer. Então você os questiona e em seguida pergunta “ok, então o que devemos fazer para chegar lá?”.

Dara acrescenta a essa discussão concordando com a importância de se cercar das pessoas mais talentosas. Ele observa que essas pessoas não só trazem habilidades valiosas, mas também têm a capacidade de influenciar e liderar dentro da organização. No entanto, Dara adverte sobre o risco de manter indivíduos altamente talentosos que não estão culturalmente alinhados com a organização. Ele destaca que, embora seja importante valorizar o talento, a falta de alinhamento cultural pode ser destrutiva. Conforme a organização cresce, é essencial equilibrar o reconhecimento do talento com a necessidade de manter uma cultura organizacional coesa e alinhada.

Este trecho do podcast destaca a complexidade de construir uma equipe eficaz, enfatizando a importância de equilibrar habilidades e talentos com alinhamento cultural e valores compartilhados. A discussão revela que, enquanto o talento é crucial para o sucesso de uma organização, a cultura e os valores compartilhados são igualmente importantes para a sustentabilidade e a saúde a longo prazo da empresa.

Pensamentos finais: transformando conceitos em ação

Ao refletir sobre o episódio “Masters of Scale – How Great Cultures are Built and Rebuilt“, diversos conceitos emergem como pilares para a construção e manutenção de uma cultura organizacional eficaz. Tais conceitos são amplamente discutidos pelos convidados, cada um trazendo uma perspectiva única baseada em suas jornadas e experiências. Se você também é um líder empresarial, a seguir estão ações concretas que pode tomar para aplicar esses conceitos na sua liderança e na sua organização:

Autenticidade: A autenticidade é enfatizada como um pilar fundamental na liderança, destacando a importância de ser verdadeiro à própria identidade e estilo. Desafie-se a realizar uma autoavaliação honesta: pergunte a si mesmo se suas ações refletem seus valores verdadeiros. Compartilhe suas histórias de autenticidade com sua equipe e observe como isso fortalece sua conexão.

Confiança: A confiança é um elemento essencial para cultivar um ambiente onde as ideias fluem livremente e a inovação prospera. Inicie um projeto onde a confiança seja o alicerce. Talvez uma tarefa de equipe onde cada membro possa contribuir livremente com suas ideias, observando como isso pode liberar a criatividade coletiva.

Transparência: A transparência na comunicação e nas decisões é crucial para criar um ambiente onde todos se sintam valorizados e parte do processo. Implemente uma política de “portas abertas” em sua gestão. Fomente uma cultura de feedback e compartilhamento de ideias de todos os níveis da organização – e veja como isso pode melhorar a compreensão e o engajamento.

Escuta ativa: A habilidade de ouvir ativamente e valorizar as contribuições de todos, independentemente do seu papel na hierarquia, é vital. Dedique uma parte do seu dia ou da sua semana para ouvir ativamente seus funcionários. Seja em reuniões individuais ou sessões de brainstorming, faça questão de valorizar as opiniões de todos.

Empoderamento: Empoderar os funcionários, permitindo-lhes tomar a iniciativa e contribuir de forma significativa, é uma estratégia chave para o crescimento e a inovação. Identifique oportunidades para delegar projetos significativos aos demais membros da equipe, permitindo que eles tomem a iniciativa e mostrem suas habilidades. Acompanhe e celebre o sucesso desses projetos.

Adaptação: A capacidade de se adaptar às mudanças e desafios emergentes é crucial para a sobrevivência e o sucesso de uma organização. Realize um workshop ou uma sessão de brainstorming sobre adaptação. Explore como sua equipe e organização podem se manter ágeis e adaptáveis às mudanças do mercado e da indústria.

Ao integrar essas ações em sua liderança e práticas organizacionais, você estará não apenas aplicando os conceitos discutidos no podcast, mas também fomentando uma cultura que é robusta, resiliente e preparada para o futuro. Comece hoje a implementar essas mudanças e observe o impacto positivo que elas podem trazer para a sua organização.

Acesse abaixo o podcast: